Rugby Para Todos


Concentração antes do jogo

21/10/2010, 13h30, Vila Nova Conceição, São Paulo. Oito alunos partiam da escola Nova Lourenço Castanho rumo à favela de Paraisópolis, localizada no bairro nobre do Morumbi. Em 2010 o NUPS buscou parcerias para se formar e realizar projetos, e a tarde no campo do Palmeirinha foi a primeira de muitas, que foram solidificando a ponte com o instituto Rugby Para Todos.

Meninos vendo o jogo
O intuito foi o de realizar troca, propósito do NUPS, por meio do esporte, que seria oferecido aos alunos da Lourenço, em treinos na escola, e no Palmeirinha, junto com os alunos do RPT. Mas obviamente não podíamos deixar de retribuir o que nos seria oferecido, e surgiu então a ideia de realizar oficinas (música, inglês, teatro, e o que mais os nupcianos tivessem em suas bagagens para ensinar) aos alunos de lá. “E quando estas duas propostas passaram a ter um fim muito maior que somente o esporte e o jogo em si, ou o simples ensinamento sobre artes e idiomas, envolvendo uma troca de experiências e conhecimentos de dois públicos distantes e próximos ao mesmo tempo – alunos do Lourenço Castanho e alunos do Rugby Para Todos em Paraisópolis vivem a cerca de 10km de distância, mas não convivem e não conhecem a realidade um do outro – ela passou a ser ainda mais ousada, muito mais valiosa e empolgante.”, escreveu o diretor presidente da ONG e surfista, Fabrício Kobashi de Faria.
Time masculino de rugby

O instituto? Há sete anos um jovem surfista, atleta da seleção brasileira de Rugby e morador do Morumbi, inventou de inventar um projeto que unisse seus ideais com suas paixões. Com meia dúzia de bolas, um parceiro e muita ousadia, nascia o Instituto Rugby Para Todos no meio da favela de Paraisópolis. Os objetivos? Difundir esta modalidade esportiva e colaborar para a educação e formação de crianças e jovens pobre que residiam nas cercanias do bairro onde ele cresceu. Hoje a ONG possui centenas de alunos, já conta com amplo reconhecimento e projeção nacional e começa a dar seus primeiros passos para além da Terra Brasilis.

Time feminino de rugby
As primeiras experiências que saíram só no final de 2010 deixaram ânimo e expectativas enormes para 2011; em dois meses foram feitas oficinas de teatro e música no espaço conquistado do CÉU Paraisópolis, e ocorreram treinos no Lourenço e treinos integrados na Paraisópolis, além da participação dos alunos da LC no time dos Leões da Paraisópolis na Virada Esportiva. As oficinas aconteceram um pouco no improviso, mas os frutos colhidos foram imensos, tanto para os alunos delas que tiveram a oportunidade de entrar em contato com o teatro e a música, tanto para as professoras de primeira viagem, que tiveram de juntar seus conhecimentos (e buscar mais) e toda sua inexperiência para ensinar crianças de 9 a 12 anos. Os treinos mostraram sensibilidade e humildade dos dois lados, e os encontros revelaram união e respeito, para além do esporte.
Rugby não tem idade

Em 2011 tudo continuou. As oficinas foram mais bem planejadas e idealizadas, resultando em experiências incríveis. Os treinos, além de darem continuidade à formação atlética e ao trabalho em conjunto que ensina a ter respeito e disciplina, só intensificaram a integração entre os lados. Além desses treinos foram feitos também outros no Parque do Ibirapuera, e ainda houve mais uma participação da Lourenço, ou melhor, dos Leões da Paraisópolis, pois neste ano ganhamos espaço expressivo no time, na Virada Esportiva, no Parque Vila Lobos. Ela foi mais uma prova das relações construídas ao longo de mais de um ano de trabalho. Pretendemos ainda para esse ano, realizar uma atividade de integração fora das quatro linhas, e um torneio de encerramento. A partir de agora, queremos ampliar o projeto na escola, não só no Ensino Médio, mas para que também aconteça no Ensino Fundamental II, e sirva como exemplo de quebra das barreiras sociais.
  A integração tirou o caráter utópico que havia nisso, vimos uma aproximação concreta, um intercâmbio de realidades. “Vi que antes de mais nada, antes até do preconceito, o ser humano tem curiosidade, tem desejos de conhecer, de trocar e de conviver, juntos.”, foi a impressão do professor Tiago na tarde de outubro de 2010. E ela não parou por ali...








Oficina de Música

“Tu toca o quê?”

        Todo o idealizado pelo NUPS durante 2010 teve de ser posto em prática. As tão sonhadas “trocas”, mudanças de olhares e o presenciar novas realidades tinham de ser concretizados. Por isso, começamos a agir no final de 2010, com as parcerias que surgiram e em especial a com o projeto Rugby Para Todos.
        O NUPS ficou encarregado de dar oficinas para os alunos do Rugby, que fica na Paraisópolis, em troca do Rugby oferecido para os alunos da Lourenço. Para isso, foi necessário escolher áreas de nosso conhecimento. A Caroline e a Isabella escolheram o teatro, e nós, Julia Rodrigues e Mariana Carvalho, escolhemos a música.
        Mas música é um tema muito amplo. Tivemos de reduzi-lo à percussão, por questões técnicas de ensino e viabilidade em termos de transporte e dificuldade de ensinar instrumentos musicais mais complexos, não meramente rítmicos. E isso foi difícil porque não é algo que havíamos estudado muito, ainda mais para sermos professoras. O que foi de muita ajuda para nós foi a presença de um amigo músico do Tiago, o Zé Mazzei (inclusive professor de iniciação musical para crianças), que nos ajudou a elaborar e dar as aulas.
        Em 2010, contamos com mais ou menos 4 alunos, em aulas numa sala um tanto quanto precária acusticamente, semanalmente no CÉU Paraisópolis. Ensinamos a eles ritmos brasileiros básicos, como o Funk e o Baião, além de outros jogos rítmicos e canções. Os alunos tinham por volta de 10 anos, e não deram trabalho nenhum, o que nos impressionou muito. Além das aulas tivemos a sorte de conhecer O Oscar e o Acácio da Orquestra da Paraisópolis, que enriqueceram as aulas. Fizemos improvisos com os instrumentos, o que nos propiciou uma experiência incrível!
        Acabamos nossos meros 3 meses de aula cheias de ideias e expectativas para o próximo ano, que está ocorrendo agora.
2011 veio para nós com uma importante diferença. Estávamos sozinhas. O Zé não podia mais participar das aulas conosco toda semana, e somente deu algumas ajudas para idealizar algumas aulas no início. (In)felizmente não contávamos mais com nosso apoio, e tivemos de nos virar. Corremos atrás de livros, pessoas a conversar e internet, para tentar montar um curso mais bem trabalhado do que em 2010 (afinal, estávamos começando), e também desenvolver a habilidade de dar aulas. Também pensamos em fazer o curso dialogar com a oficina de teatro mais para frente, com alguma trilha sonora de uma peça. Algo vital teve de ser levado em conta: como dar aulas para crianças/pré-adolescentes de 11 anos?
        Não tínhamos a mínima ideia (mesmo com a oficina do ano passado) de como conseguir o interesse das crianças, de quais jogos passar, músicas, como lidar com a responsabilidade de ser professor. Conseguimos falar com a Marili, nossa professora de música e flauta doce do primário, aqui da Lourenço. Nos encontramos, e ela nos deixou assistir uma de suas aulas, nos lembrou de jogos que fazíamos quando éramos alunas dela, nos contou um pouco sobre como funciona a mente de uma criança de 11 anos (sim, faz pouco tempo que fomos, mas não lembramos). Além disso, conseguimos o auditório do CÉU, que é um teatro impecável, enorme, e com uma acústica imensamente melhor.
Começamos 2011 com mais de dez alunos na primeira aula. É claro que sempre há desistência, e acabamos fechando um grupo de mais ou menos seis alunos, ou alunas, pois só há um menino. A turma nos pareceu um tanto quanto incontrolável no início, porém aprendemos a lidar com toda a energia que vinha das crianças. O principal remédio para isso foram os jogos que criamos ou músicas que passamos. Procuramos adaptar a música ao universo delas, para que pudessem pegar gosto por ela através da diversão. Ano passado tinha tido, talvez, teoria demais.
As aulas fluem muito bem, e adaptamos jogos de música com pega-pega, esconde-esconde, passamos músicas do nosso universo e também as que elas nos pediram, improviso, batuques e até um teórico na lousa, que nos surpreendeu muito. Com isso, aprendem muito melhor, são muito talentosas.
 As meninas são amigas, e todas muito legais, super carinhosas com as professoras. O progresso delas tem nos animado muito, e faz com que agora tenhamos de buscar mais base ainda para seguir em frente. O menino tem um pouco de dificuldade de concentração, às vezes acaba ficando para trás, e por isso é nosso maior desafio no momento. Apesar disso, é notável o quanto as aulas são importantes para sua evolução. Algumas vezes o Acácio e o Oscar, da Orquestra da Paraisópolis participam das aulas, e vem conversar conosco, o que é fantástico.
Ser professora é uma responsabilidade e tanto (sim, agora entendemos nossos professores)! As aulas têm de ser todas preparadas, os instrumentos levados da escola. Toda semana: “Selma, preciso da movimentação de bens”, carrega caixa, anda pra cá, pra lá, trás som, violão, lousa, chama táxi, chega na portaria: Um surdo – confere, vinte baquetas – confere, caixa, tamborins, agogô, pandeiros, bongô, caxixis, - confere, confere, confere, “Tudo certo meninas.”, abre porta-malas, “Vamos para o CÉU Paraisópolis, sabe onde fica?”, trânsito, leva tudo, dá aula, chama táxi, porta-malas, trânsito, chega na escola, confere, guarda.
O trabalho é grande, entretanto, tudo isso tem valido muito a pena. Estamos nos mostrando cada vez mais seguras para dar aula, e com certeza estamos aprendendo muito mais do que nossos alunos. Essa imersão constante numa realidade diferente vale muito, faz com que as experiências pontuais formem um todo, uma nova perspectiva do que é ser criança, do que é viver outra realidade, do que é aprender.
Nem sempre as aulas são boas, nem contam com todos nossos alunos. Mas o indescritível que é sair de lá depois de uma aula maravilhosa compensa tudo.

                                              Mariana Carvalho e Julia Rodrigues

Alguns vídeos sobre o Instituto: